INSÔNIA
Um cavalo branco num galope rápido passa por mim e desaparece no ar. Eu morto, meu corpo morto na sala e mesmo assim penso em regar as plantas - sempre acho que elas podem estar sem água. Morrer de sede deve ser foda. Deitei cedo. Virei e revirei pra todo lado. Não tenho sono. Quando tenho, sonho que estou morto. Melhor não dormir. Melhor não ceder. Melhor continuar, mesmo sem saber porra nenhuma. E quem é que sabe alguma coisa? Tem esse cavalo. Ele sorri enquanto passa por mim, depois some feito fantasma. Eu no meio da sala, com uma fantasia de carnaval, dessas de pierrô. Um samba tocando no fundo. Sacudo forte a cabeça. Não posso estar ali. Tem uma rima boa o samba. Tem um swing bom. Penso que nunca soube qual é a do samba. Tem gente que gosta. Deito de costas no tapete. Poderia mesmo estar morto. Você poderia estar aqui e tirar minha calça. Poderia chupar meu pau. Poderia fazer com que eu voltasse a viver. Mas você está longe. Deve estar. Quando eu penso em você, sempre acho que está longe. Ás vezes você está no quarto ao lado. Os médicos disseram que isso é normal no começo. São as “contra indicações”. O que os médicos sabem sobre eu e você? Como pode ser? Não existe qualquer possibilidade deles saberem. Não mesmo. Mais uma vez o cavalo. Desta vez devagar, bem lento. Tem uma cabeça estranha. Uma cabeça enorme, redonda, uma abóbora com dentes grandes e afiados. Melhor eu tentar dormir, quem sabe a morte não seja só um lugar onde eu possa descansar? Quem sabe já não estou morto?
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