segunda-feira, 29 de setembro de 2008

+BENETT ("Um certo texto que escrevi junto com a Rafaela Santin sobre o show do Scorpions em minha cidade natal")!

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Benett e Rafaela

Scorpions


O Morro dos ventos uivantes
Ponta Grossa é uma cidade em que venta muito. Tem todo o tipo de vento, os alísios, as brisas, os vendavais e, claro, os ventos da mudança. Foram esses que trouxeram à cidade uma banda hard-rock de Hannover chamada Scorpions, fundada em 1972 por cinco caras que pareciam o resultado do cruzamento entre a Joni Mitchell e o Johnny Winter, e seus principais hits se chamam Still Loving You e, vejam só!, Wind of Change. Vocês devem conhecê-los das coletâneas de música estilo Love Metal. Mas agora os caras estão bem diferentes, mais para o cruzamento entre Iggy Pop e uma caixa de uvas-passa.

Os que pagaram até 70 reais
Foi numa noite de vento e chuvas esparsas, num lugar chamado Centro de Eventos - onde rola a München Fest- que os Scorpions tocariam. Esse clima frio e chuvoso, num lugar mal iluminado, eu conhecia bem: é a extensão do melancólico bairro onde morei, na década em que Klaus Meine e Rudolf Schenker eram novidade.
A honestidade dos fãs chega a ser comovente. Você vê em seus olhos a sinceridade com que eles gostam daqueles caras que estão em cima do palco. Não importa que Still Lovin You dê “caimbra nas bolas”, como disse um dos muitos fãs com quem conversei naquela noite. Afinal, eles eram os clássicos fãs de rock’n’roll – para quem um grupo de rock significa alguma coisa real. Oposto dos que vi num show do White Stripes: quando o vermelho e o branco caíram de moda, eles abandonaram o duo por outro grupo hype do momento.
Os fãs dos Scorpions pagaram até 70 paus para estarem ali e sabiam que estar ali agora valeria cada centavo daquele dinheiro.
Haviam muitos jovens, eram a maioria, talvez. Uma família com a bandeira do Paraguai nas costas, garotos com escorpiões de isopor enormes nas mãos, garotas com tiaras de chifrinhos cintilantes e uma mulher com um bebê no colo, embalando-o ao som da guitarra de Andreas Kisser, do Sepultura, convidado de honra.

Os que pagaram até 300 reais
Alguns dos que estavam no camarote não sabiam exatamente o que acontecia lá no palco. Se colocassem um cavalo relinchando no microfone, eles estariam lá do mesmo jeito, porque o que importava era mostrar os dentes postiços para o maior número possível de colunistas social que circulava por ali. Sim, os dentes eram postiços, o cabelo era postiço, as unhas eram postiças, os seios eram postiços e a personalidade era postiça, moldada à base do sobrenome de alguma dinastia local e dinheiro antigo, acumulado há gerações e gerações. Pessoas tão autênticas quanto o português com que Klaus Meine gritou “bua note, Punta Grôssa!”.
No camarote havia cadeiras de plástico brancas e chope de graça em copos plásticos; os ricos refestelavam-se na felicidade de saber que havia uma divisão de classes naquele show, e eles faziam parte da classe que estava literalmente por cima. Mas classe é uma palavra cara, porque tomar chope em copos de plástico, usar roupas de caubói – no show de uma banda hard-rock – combinando com detalhes rosa, não é exatamente um exemplo de classe.

Little City Nights
Os Scorpions merecem consideração. Eles não deixaram o fracasso subir à cabeça. Eles não têm um sucesso há quase duas décadas. Se eu ganhasse 1,3 milhão em duas semanas, também não faria diferença. Foi um grande show. Com elementos capazes de comover os duros corações de alguns motociclistas com visual Hells Angels que estavam por ali. Com os hits, os solos, as coreografias, e os músicos nitidamente empenhados – apesar de eu desconfiar que, pela idade, eles saíram de maca do palco.
A despeito de tudo isso, de todas as bandas alemãs que já vi no Centro de Eventos, a minha predileta continua sendo aquela que toca “zig-zag, zig-zag…voi, voi, voi”.
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